Dedilhar de cordas de Norberto Lobo fala ao coração

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É sempre surpreendente quando topamos com um virtuoso que aprendeu, sozinho, a extrair sons cristalinos e limpos de seu instrumento e a construir uma sonoridade que fala ao coração.

A história do português Norberto Lobo é mais ou menos esta. Garoto ainda – uns 7 ou 8 anos – começou a arranhar o violão e pegar gosto pela coisa. Os sons nascidos das cordas lhe traziam tanta alegria quanto jogar um videogame.

“Era como o game boy. Hoje ainda é assim. A guitarra ainda é como um game boy, ainda é uma brincadeira, ainda é um jogo. Normalmente o problema é ter de parar de tocar, é ter outras coisas na vida para fazer.” – para o Diário de Notícias.

Mais tarde o violão foi trocado pela guitarra acústica e pela elétrica, mas ainda se percebe nele a mesma satisfação de tocar que o antigo instrumento lhe trazia quando era criança.

Do trabalho solo ao ensemble

Norberto Lobo é o tipo de músico que sabe, sim, que tem uma técnica apurada, mas não a deixa sobrepujar o espaço reservado à melodia e à composição. Bastar ouvir qualquer um dos cinco discos de Norberto e o que se percebe é o quanto as suas composições e interpretações são poéticas e expressivas.

Com cinco trabalhos solo lançados (o primeiro deles em 2007, o lindo Mudar de Bina), o guitarrista foi diversificando aos poucos.

Tudo começou com o dueto com o baterista João Lobo, que resultou no disco Mogul de Jade (2013). O dueto logo abriu espaço para a entrada de outros músicos, transformando-se no sexteto Oba Oba. Lançado em 2015 pelo selo suíço Three:Four Records, o primeiro álbum do ensemble (Oba Oba) foi descrito por Clive Bell (revista The Wire) como música instrumental híbrida que canibaliza a canção popular. Sir Robert Williams, o segundo disco, chegou em 2017.

Norberto, ao que tudo indica, deve lançar um novo trabalho solo em 2018. Aguardemos o que vem por aí. É certo que coisa boa será.

Selecionei quatro músicas: Mudar de Bina, do disco de estreia; Golden Pony Blues, de Mel Azul (2012); Pen Ward, de Fornalha (2014); e Pata Lenta, do disco homônimo (2009).

 

Do Make Say Think lança disco nos 20 anos da banda

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A Do Make Say Think é uma banda canadense criada em 1996. Se você me perguntar por que o título fala em aniversário de 20 anos, digo que é porque 1997 marca o lançamento do primeiro álbum (homônimo), produzido e lançado pelos garotos da banda. São eles Ohad Benchetrit, David Mitchell, James Payment, Justin Small e Charles Spearin. Ohad e Charles também são membros da bacanudérrima Broken Social Scene.

No comecinho da banda, os caras costumavam ensaiar numa sala de aula de uma escola, cujas paredes tinham os verbos Do, Make, Say, Think escritos nas paredes. Eles aproveitaram a deixa e se apropriaram do nome.

O DMST faz um som instrumental, viajante. Tecnicamente falando, o som deles se encaixa no gênero pós-rock, ou post-rock.

Depois de seis álbuns e uma parada estratégica para que os rapazes pudessem se dedicar a outros projetos, pausa esta que durou 8 anos, a Do Make Say Think volta com Stubborn Persistent Illusions (2017), um disco lindo, gerado devagarinho – foi gravado entre 2014 e 2016, segundo informa o The Line of Best Fit.

“A gente está junto há mais de 20 anos. A gente é fundamentalmente uma banda instrumental, embora de vez em quando a gente coloque letras nas músicas, geralmente interpretadas por amigos. Desde que estamos juntos, nossa música conseguiu entrar no coração de muita gente em todo o mundo. O que mais uma banda pode querer? Nós somos gratos. Não é uma algo pequeno despejar nosso coração (se corações fossem líquidos) em nossos dedos e produzir sons que refletem perfeitamente nossos sentimentos e conseguir que esses sentimentos sejam aceitos e recebidos por ouvidos sedentos de emoção. Isso torna a vida melhor “. – para o site da gravadora deles, a Constellation

Selecionei duas músicas: Bound and Boundless, de Persistent Illusions; e Soul and Onward, de Other Truths (2009).

 

 

Os Mutantes del Paraná querem fazer você bater os pezinhos

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Entre na página da banda argentina Mutantes del Paraná no Bandcamp e leia como eles se descrevem. “São 9 músicos deixando a vida no cenário com um único objetivo: tocar o coração e fazer você mover os pés.” Mover os pés com música instrumental – uma pitadinha de jazz, outra de folk, um tantinho de tango, outro de sonoridades regionais, rock, enfim. Uma salada musical deliciosa.

“Com o Los Mutantes fazemos um folk do mundo: fazemos chacarera (música popular do norte da Argentina), algo balcânico, algum ar flamenco, tudo mesclado na desprolixidade do rock. A nossa música é uma música sem fronteiras de estilo. Centra-se no instrumental e varia tanto de paisagem quanto de estado de ânimo.” Charly Valerio para o Rock.com.ar

 

O Mutantes surgiu em 2011, em Zárate (cidade da província de Buenos Aires à beira do rio Paraná), primeiro com três integrantes, para logo chegar aos nove. El Entrerriano, o primeiro disco, chegou em 2013. O segundo, Noctámbulo, dois anos depois.

O grupo ficou conhecido localmente pelas festas dançáveis que organizam. Chamadas por eles de Jolgorio Mutante, são eventos mensais em que, além de tocar, convidam uma banda para animar ainda mais a festa.

Você ouve El Entrerriano, Zambana e El Negro Miguel, todas do álbum de estreia.

 

 

 

 

 

 

 

The Sconek-T: o quarteto eletroacústico que vai te surpreender

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Das coisas boas de ficar pesquisando sons mundo afora é topar com bandas ou cantores que nos surpreendem. Foi o que aconteceu quando ouvi o quarteto mexicano The Sconek-T, brincadeira com a palavra “desconecte”.

Há pouca coisa sobre eles na internet. Uma pena também que, ao escrever este texto, o site (novo, fiquei sabendo) estava fora do ar. Mas vale dar uma pesquisada em alguns dias:  www.desconecte.mx.

O grupo surgiu em 2007 e é formado por Israel Torres e Eliasib Morán (nos violinos), Omar Sánchez, no violoncelo, e Adrián Molina, na percussão.  A ideia do grupo era usar instrumentos originalmente acústicos e processá-los eletronicamente de forma a gerar um som mais contemporâneo.

O primeiro disco (Acoustic Project) veio em 2008, basicamente com versões para músicas de bandas mexicanas consagradas, entre elas Café Tacvba e os Fabulosos Cadillacs, além de clássicos como Besame Mucho. O grupo, aliás, fez versões incríveis para canções do Coldplay, Beatles, entre outros.

Os dois discos posteriores são Corriente Alterna (2012) e a trilha sonora que fizeram para o filme O Corcunda de Notre Dame, de 1923, a primeira de uma das muitas adaptações para o cinema do clássico de Vitor Hugo. As canções compostas pelo The Sconek-T para o filme ganharam um prêmio da Cinemateca Nacional em 2011.

Por falar em trilha sonora, em 2012 o quarteto também musicou, só que dessa vez ao vivo, Berlim, sinfonia de uma grande cidade, documentário histórico de Walther Ruttmann, realizado em 1927.

Você ouve Jorotango (não consegui encontrar de que disco é, se é que pertence a algum dos discos da trupe). Algodón de Azucar está do disco Corriente Alterna (2012). A terceira música que sugiro (também não consigo encontrar de quem disco é)  é a versão para Come Together (dos Beatles) e Another Brick in the Wall (do Pink Floyd).

 

 

 

 

 

 

Playlist: Músicas para ouvir ao entardecer

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Esta playlist não foi feita por mim, mas pelo pessoal do Piano & Coffee Co, uma iniciativa super legal: ajudar jovens artistas a botar de pé seus projetos e construir uma audiência sem que isso lhes custe a alma e todas as suas economias.

Fiquei sabendo da playlist por meio de um post feito pelo músico grego Manos Milonakis na página dele do Facebook. É a primeira do Piano & Coffee no Spotify e reúne, em pouco mais de 3 horas, 66 músicas instrumentais.

Nostalgia e Melancolía é daquelas playlists para ouvir depois de um dia pesado de trabalho. Ou lendo um livro. Ou ao entardecer, quando a gente se prepara para desacelerar. Ou ainda num dia cinzento e chuvoso.

Escuta só.

 

Conheça o músico grego que foi inspirado pelo movimento Dogma 95

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Eu tenho que admitir que nunca busquei saber muito sobre os sons que são produzidos na Grécia. Não me pergunte por que, mas nunca dei muita bola. Até que recentemente descobri alguns artistas incríveis, sobre os quais já falei aqui: The Man from Managra e Σtella.

Volto a descobrir um trabalho dos mais legais. Este, do músico (ele toca piano) e compositor Manos Milonakis. Originário de Thessaloniki, Manos surgiu na cena musical grega em 2006, quando montou o dueto Your Hand in Mine (também bacanudo – falarei dele logo, logo). O grupo se desfez em 2014, e Manos resolveu se lançar em carreira solo.

O primeiro trabalho foi o EP Sólfar, gravado em Reykjavik, na Islândia, com um quarteto de cordas. Vale um parênteses (a sonoridade de Manos tem tudo a ver com as paisagens e os campos abertos islandeses).

Agora, o músico embarca em outro projeto bacana: a trilha sonora para Festen, adaptação teatral do filme de Thomas Vinterberg, tido como a primeira obra do Dogma 95, movimento que propôs um cinema de autor natural, que proibia uso de filtros de luz, iluminação artificial, truques de som, entre outras coisas. Além de Vinterberg, o Dogma 95 teve como idealizador Lars von Trier.

Festen reúne 12 músicas instrumentais com base eletrônica que, além do piano, são acompanhadas por instrumentos de corda (violino e cello, por exemplo).

Sugiro 3 músicas:  Dressing e The Scolding, ambas de Festen, e Towards the Setting Sun, do álbum Sófar.

 

 

 

 

 

 

Pianista Vitor Araújo foge do rótulo de prodígio e se consolida como compositor

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O pianista recifense Vitor Araújo surgiu na cena musical em 2007. Ele ainda era um moleque, tipo 16 para 17 anos, quando ganhou um concurso de piano que o levou a fazer um concerto no Teatro Santa Isabel (Recife).

“Um dos compositores das músicas que eu tocava era um pernambucano chamado Marlos Nobre, e ele ficou muito irritado com a forma que eu interpretei sua música Frevo, porque eu adicionei coisas que não existiam na partitura. Ele mandou uma carta aberta para o jornal criticando duramente a minha interpretação, e eu era só um jovem estudante na época, tinha 16 anos. Gerou uma polêmica da qual só eu colhi bons frutos, e isso fez com que minha carreira começasse.” – em entrevista para o site Não Só o Gato. ((leia a íntegra neste link)

Fato é que depois disso ele virou o garoto-prodígio do piano brasileiro, especialmente por tocar músicas eruditas com uma pegada pop. TOC, o primeiro disco, veio mais ou menos nessa época. Porém, boa parte das músicas eram de outros compositores.

A/B, o segundo disco, de 2012, foi uma espécie de ponto de virada. Nele, Vitor Araújo começou a imprimir a sua marca e mostrou que, além de tocar bem, era bom compositor. Quase todas as músicas do álbum são dele.

Levaguiã Terê, lançado em 2016, consolida o músico como arranjador e compositor e mostra o quanto o jovem amadureceu. O disco mescla sons indígenas, africanos e europeus e, além de instrumentos de corda como viola, violoncelo e violino,  introduz instrumentos convencionais de formações roqueiras, como o baixo elétrico, a guitarra e a bateria. O álbum foi considerado um dos melhores de 2016 pela APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte).

Dá para ouvir o disco todo no site da Natura Musical.

Selecionei 3 músicas: Toque nº1 e Toque nº3, ambas de Levaguiã Terê, e Competine D’un Autre Eté, cover da música de Yann Tiersen.